Polícia argentina investiga relação entre o mercado ilegal de vinhos e facções criminosas, como o PCC

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O transporte dos vinhos, em geral, é realizado em veículos pequenos. Entretanto, já houve apreensões de caminhões carregados com o produto. Crédito: Receita Federal/Dionísio Cerqueira

A expansão do mercado ilegal de vinhos no Brasil tem sido mais notada especialmente nos últimos dois anos. Os números divulgados em 2022 pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) mostraram aumento na quantidade de apreensões de 3.206% em quatro anos. Em 2018, foram 1.700 garrafas, em 2019 quase 4 mil garrafas, em 2020 chegou a 22.737 e em 2021 foram apreendidas 56.254 garrafas de vinho.

Imagem mostra o crescimento nas apreensões de vinhos realizadas pela PRF.
Ilustração: PRF

Segundo a PRF, a maior parte do produto entra em território brasileiro na região de Dionísio Cerqueira (SC), fronteira com a Argentina – tanto que a unidade da Receita Federal da pequena cidade catarinense é a que mais apreende bebidas alcoólicas no país, representa 25% do total e a maior parte são vinhos – e o perfil de quem traz o vinho ilegalmente tem mudado nos últimos anos. Se no início das apreensões era mais comum o “pequeno contrabandista”, pessoas transportando pequenas cargas, agora o crime organizado é o dono do comércio do vinho ilegal. A utilização de veículos roubados, batedores e olheiros são alguns dos artifícios praticados. As quadrilhas do tráfico de drogas estão diversificando o leque de crimes com o comércio ilegal de vinho, uma forma de investimento criminoso para capitalizar as organizações. É o que aponta um levantamento realizado pelos setores operacionais da PRF no Paraná. “Não é o pequeno muambeiro que vai ali comprar um pouco de vinho e trazer, são quadrilhas altamente organizadas“, comenta um policial rodoviário federal que atua em operações contra esse tipo de crime.

Todo esse cenário já registrado aqui no Brasil tem sido motivo de preocupação na Argentina por causa do aumento da criminalidade. Em reportagem exibida pela Rede Record, há entrevistas do juiz federal da província de Misiones, Miguel Ángel Guerrero, em que ele comenta que o líder do Primeiro Comando da Fronteira é argentino e a organização seria parceira do Primeiro Comando da Capital (PCC) para trazer vinho de forma ilegal do país para o Brasil. Ainda de acordo com o juiz, os crimes acontecem para financiar o terrorismo, o contrabando e o tráfico de armas e pessoas.

Meios de comunicação argentinos e brasileiros têm divulgado essa escalada de violência, principalmente na cidade de Bernardo de Irigoyen (11 mil habitantes), que faz fronteira com Dionísio Cerqueira. Em geral, a logística do vinho ocorre por meio do transporte das garrafas em veículos pequenos, que atravessam as fronteiras secas ou em embarcações clandestinas, via fluvial (como no caso da fronteira entre Foz do Iguaçu (PR) e Puerto Iguazu (AR). Em relação à armazenagem, não há grandes depósitos, a distribuição acontece conforme demanda e os principais meios são pelas compras online: marketplaces, e-commerces e mídias sociais. Mas, nesse comércio também estão distribuidores, varejistas e restaurantes.

Luciano Stremel Barros, Presidente do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (IDESF), comenta sobre a diferença de preços do vinho no Brasil e na Argentina, a logística já estruturada e a capilaridade do produto no mercado interno. “O descaminho de vinhos é um crime econômico e os grupos criminais se aproveitam de toda a logística já existente relacionada ao tráfico de armas, drogas e do contrabando de outros produtos para ingressarem o vinho argentino no território nacional. A alta carga tributária – a média no valor de tributação de vinhos no Brasil é de 47% e há estados em que se chega a pagar 68% em tributos – e o custo Brasil para determinados produtos têm historicamente incentivado a quem já está no mundo do crime a migrar de forma rápida para outros tipos de atuação ilegal”.

Para se ter uma ideia desta diferença de tributos do Brasil e outros países, no início do ano o IDESF produziu uma tabela comparativa entre os impostos pagos no Brasil e no Paraguai. Os dados referentes ao Brasil são uma média, levando em conta as diferenças que ocorrem entre os estados e com base na tabela do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT). A média nacional relativa a vinhos e champagnes, por exemplo, é de 47%. No Paraguai, funciona assim: nos casos em que há a cobrança do Imposto Seletivo ao Consumo (ISC) – bebidas alcoólicas (de 5% a 11%) – quem paga são as fábricas ou as importadoras. O consumidor ou cliente final pagará o Imposto sobre o Valor Agregado (IVA), fixado em 10% nos exemplos apresentados.

Para ler mais sobre o assunto

Polícia descobre esquema milionário de contrabando de vinho ligado ao PCC
https://recordtv.r7.com/balanco-geral/videos/policia-descobre-esquema-milionario-de-contrabando-de-vinho-ligado-ao-pcc-09062022

O vinho na lista do WhatsApp pode ser do PCC?
https://revistaadega.uol.com.br/artigo/o-vinho-na-lista-do-whatsapp-pode-ser-do-pcc.html

O mercado ilegal de vinhos no Brasil
https://www.idesf.org.br/2021/12/02/o-mercado-ilegal-de-vinhos-no-brasil/

A tributação no Brasil e a entrada de produtos ilegais no país
https://www.idesf.org.br/2021/11/25/assunto-antigo-problema-recorrente-a-influencia-da-alta-tributacao-no-brasil-e-a-entrada-de-produtos-ilegais-no-pais/

Operação Dionísio – Receita Federal realiza maior operação da história no combate à entrada irregular de vinhos no país
https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/noticias/2021/marco/operacao-dionisio-receita-federal-realiza-maior-operacao-da-historia-no-combate-a-entrada-irregular-de-vinhos-no-pais

Las balas que matan en Bernardo de Irigoyen y se esfuman en la frontera
https://www.elterritorio.com.ar/noticias/2021/11/21/728437-las-balas-que-matan-en-bernardo-de-irigoyen-y-se-esfuman-en-la-frontera/

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